Remarcom

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Paisagem

É como ver um pedaço do cosmos e lá, meu lugar guardado. Porque há, penso. E se penso, existe. Ao ver essa paisagem, ao meu lado estava Einstein e a sua teoria do tempo relativo a explicar os movimentos universais. Os pontos de fuga, o espaço curvo, a influência dos astros na configuração do que? Do cosmos, ora. Então me senti profundamente grato por te procurar. Porque tempo não é a medição da velocidade de um deslocamento, da energia necessária para efetivar o movimento e mesmo da quantidade de segundos exigidos na empreitada. Tempo, assim, não seria uma medida, mas o lugar onde guardamos nossas coisas, as experienciamos e as modificamos no processo. Depois disso, colocamos o resultado desse contato onde? No cosmos, ora. Voltava para casa, entre pensativo e melancólico. Fui buscando a alegria de um encontro. Retornei me distanciando da frustração que o desencontro causa. Li algo da Martha Madeiros que dizia mais ou menos isso, olha que interessante.

Viajar é um ato de desaparecimento

Na verdade, a frase é de um escritor dos EUA, chamado Paul Theroux. Martha o usou para justamente se contrapor a afirmação. A escritora acha que é ao viajar que a sua essência aparece, você se torna um você mais legitimo e pleno. Ao ir ao teu encontro, lembrei como gosto de estrada. De parar para uma foto como a que trouxe aqui. De andar em uma velocidade maior do que estou acostumado. De cantar enquanto dirijo. Chegar sem hora. Ou nem chegar, apenas ir. Por isso, diferente de Paul ou Martha, acho que viajar é um ato de coragem. Corre-se riscos como não encontrar o esperado. Do tempo não ser aquele. Do dito não ser ouvido. Das coisas serem o que são. Mas também é possível dar de cara com um momento como o dessa foto, onde o tempo está num modo off gigantesco. A imensidão do lugar diminui qualquer coisa. Solidão, pressa, alegria, certezas, alívios, discursos ou ele mesmo, o grande, majestoso e imponente tempo. A nuvem e a rocha que habita a nuvem convivem sem urgências ou qualquer sinal do definitivo. Estão ali e agora porque seu tempo é agora e ali. Não se procuram, apenas compartilham seus instantes de existência.

Viagens ensinaram a Ulisses os caminhos para volta à Itaca. Ele não era infeliz na Ilha de Calipso. Mas feliz, isso não era. É o que o cosmos nos cobra pelo show que nos apresenta: que sejamos as pessoas certas para um certo lugar, prontos para sermos a pessoa certa, na hora certa e em seu lugar. Estar distante do que se quer não é o contrário de certo. Não se trata de uma luta entre o correto e o errado. Nem é uma luta. É a necessidade de se fazer algo, o seu próprio algo, à respeito de alguma coisa cuja feitura se transforme em propósito. E o que é o propósito? É você ocupar seu lugar no cosmos, ora. E para isso, é essencial viajar. (sempre e muito)